Em atitude louvável, Lula elogiou a iniciativa do então governador Leonel Brizola de implantar os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) no Rio de Janeiro, nos anos 1980. Mas a estratégia de mudar a educação do país por unidades escolares isoladas, quatro décadas atrás, não resolveu os problemas de hoje. No lugar de escolas, o Brasil precisa de Cidades inteiras com Educação Federal (Cefes), até formar um sistema de educação de base com qualidade e equidade para todos.
A solução já existe: ampliar para todas as crianças o sistema de escolas públicas federais. Essas escolas já demonstram qualidade superior à média nacional. Mas ainda falta oferecer a todos seus alunos a formação para terminarem a educação de base plenamente preparados para o mundo contemporâneo: falar e escrever bem o português; fluente em pelo menos mais um idioma; conhecer fundamentos de matemática, ciências, geografia, história, artes, filosofia; debater temas do mundo moderno; usar ferramentas digitais; ser capaz de administrar suas finanças particulares.
Há décadas, essa solução é limitada a um pequeno número de brasileiros que pode pagar escolas particulares ou que consegue acesso a competentes escolas federais: um sistema injusto, porque é exclusivo para poucos, e ineficiente, porque desperdiça milhões de cérebros, principal recurso do mundo atual.
Além da injustiça, o Brasil continua barrando o potencial de 80% de seus cérebros. Sem uma política nacional ambiciosa e que tenha instrumentos federais efetivos, em 2041, apenas 50% dos 2,5 milhões de brasileiros que nasceram em 2023 terminarão o ensino médio; no máximo, a metade deles plenamente preparada para as exigências do mundo contemporâneo.
Hoje, pagamos elevado preço por esse descuido histórico. Está no momento de fazer a inflexão necessária para construirmos o país que desejamos. Nenhum governo será capaz de implantar esse sistema em todo o país durante um ou dois mandatos, mas o governo Lula ainda tem condições de espalhar o padrão federal em 50 a cem cidades com 10 mil alunos cada. Seu governo estaria dando início à revolução que o país precisa se quiser aproveitar o recurso intelectual de cada brasileiro.
Outros presidentes adotaram estratégias nacionais para indústria e infraestrutura, outros investiram no aumento do número de alunos no ensino superior, mas nenhum assumiu a responsabilidade nem definiu metas e rumos ambiciosos para a base do progresso, que é a educação básica.
Lula ainda pode deixar essa marca, originada em seu governo com ambição transformadora para todo o Brasil. Se ele não quiser, esperemos que em 2026 algum candidato apresente a proposta das Cefes em sua plataforma eleitoral. E que os eleitores o escolham.
(*) Cristovam Buarque é professor Emérito da UnB e membro da Comissão Internacional da Unesco para o Futuro da Educação